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A ONU Mulheres é a organização das Nações Unidas dedicada à igualdade de gênero e o empoderamento das mulheres.

Brasil

Brasil discute validação de diretrizes nacionais para investigação de feminicídios



08.05.2015


Acesse aqui o Modelo de Protocolo Latino-Americano de Investigação de Mortes Violentas de Mulheres por Razões de Gênero, elaborado pela ONU Mulheres e pelo Alto Comissariado de Direitos Humanos da ONU

Brasil discute validação de diretrizes nacionais para investigação de feminicídios/

Autoridades se reúnem para estabelecer diretrizes nacionais para a investigação de assassinatos de mulheres com requintes de crueldade
Foto: Divulgação SPM

A ONU Mulheres e a Secretaria de Políticas para as Mulheres da Presidência da República concluem hoje (8/5), em Brasília, a Oficina para Validação do Documento de Diretrizes para elaborar protocolo sobre feminicídio no Brasil. Este é um instrumento necessário para investigar, processar e julgar as mortes violentas de mulheres na perspectiva de gênero. O encontro se iniciou na quarta-feira, na sede da Organização Pan-Americana da Saúde (OPAS)/Organização Mundial da Saúde (OMS), com  o apoio da Embaixada da Áustria e a participação do Ministério da Justiça.

Estiveram presentes no evento de abertura a a representante da ONU Mulheres no Brasil, Nadine Gasman;  representante da OPAS/OMS no Brasil, Joaquín Molina; a ministra da Secretaria de Políticas para Mulheres da Presidência da República, Eleonora Menicucci; a vice-presidenta do Supremo Tribunal Federal Carmen Lúcia; a defensora pública Rosana Leite; a embaixadora da Áustria, Marianne Feldmann; a Secretária Nacional de Segurança Pública do Ministério da Justiça, Regina Miki;

Nadine Gasman, representante da ONU Mulheres Brasil, contou que é uma das autoras do Modelo de Protocolo Latino-Americano de Investigação de Mortes Violentas de Mulheres por Razões de Gênero, e que a equipe tinha a impressão de que outros países eram trágicos campeões em feminicídio. “O Brasil guardava esse segredo muito bem”, afirmou. “Só quando vim trabalhar no país é que me dei conta que o Brasil responde por 40% dos feminicídio de toda a América Latina”. Nadine seguiu explicando que, em nações como a Guatemala, o índice de impunidade para crime de feminicídio chega a 98%. “E o recado que isto passa é muito claro: que os homens podem matar as mulheres que não vai acontecer absolutamente nada”. Com o protocolo, o Brasil terá um documento guia, em português, que conjuntamente com o trabalho e os saberes de toda a equipe envolvida na sua elaboração, vão criar um divisor de águas no tratamento do feminicídio no país. “Nós queremos punir e ressarcir, mas também queremos prevenir. Falar do feminicídio, investigar o feminicídio com uma perspectiva de gênero, divulgar esses saberes para a opinião pública, indenizar robustamente as vítimas e punir com rigor passa uma mensagem inequívoca de que a violência de gênero não será tolerada na nossa sociedade”.

A ministra Eleonora Menicucci parabenizou a todas as juízas, defensoras públicas, delegadas e delegados das Delegacias Especiais de Atendimento à mulher (DEAMs) em todo o Brasil pela tolerância zero com a violência contra as mulheres. Menicucci agradeceu à sua equipe em nome da secretária nacional de Enfrentamento à Violência contra as Mulheres, Aparecida Gonçalves, que liderou o trabalho para a realização do documento.

A ministra lembrou que a luta contra a desigualdade de gênero começou com a assinatura do pacto pelo fim da violência e culminou com a sanção da tipificação do crime de feminicídio e, agora, com o Modelo de Protocolo Latino-Americano de Investigação de Mortes Violentas de Mulheres em Razão de Gênero. “O Brasil é o décimo sexto país da América Latina a tipificar o crime de feminicídio, aumentando a pena. Mas não basta punir, tem que dar exemplo. Em dois mil e onze, nós firmamos a lei Compromisso e Atitude pela Lei Maria da Penha. E isso foi um grande passo para reiterar que precisamos agir com celeridade”, disse a ministra, que lembrou do assassinato de Elisa Samudio, Marcia Nakashima e da condenação dos integrantes da banda New hit, que estupraram um grupo de meninas que entrou no ônibus da banda em busca de fotos e autógrafos. “Nós estamos felizes em dar o exemplo? Não, a gente preferia não ter que dar. Mas quando a condenação é pedagógica, é importante que seja aplicada com todo o rigor e que seja divulgada. Ninguém traz de volta quem morreu, e o feminicídio tem um rosto dolorido e trágico. Mas podemos mandar a mensagem de que os crimes não vão ficar impunes, e assim salvar as vidas de muitas outras mulheres”.

Inovações na gestão pública – Regina Miki destacou a necessidade de ousadia e coragem na gestão pública no país. E contou que estava concentrada no futuro, e em que medidas tomar após a assinatura do protocolo: “Nós não queremos privilégios. Mas, para ter igualdade, precisamos ser tratadas de forma diferente”. Miqui abordou ainda a necessidade de um curso de capacitação para magistrados, e da criação de um grupo de trabalho com um olhar diferenciado para combater a discriminação de gênero, o assédio moral e sexual dentro das corporações: “Nós precisamos também cuidar de quem cuida das mulheres civis vítimas de violência”.

Em seu discurso, a embaixadora da Áustria no Brasil falou da satisfação do governo do seu país em financiar a ONU Mulheres para que a entidade transformasse o protocolo em realidade, além de todo o trabalho desenvolvido em parceria com a instituição e outros atores, que culminou na tipificação do crime de feminicídio: “Desejo muito sucesso na aplicação do protocolo em todo o país, e que no futuro sejam desenvolvidas estratégias de prevenção da violência, para que os feminicídio não se tornem realidade”.

Rosana Leite, da Defensoria Pública, disse que, desde a aplicação da Lei Maria da Penha, o número de mortes de mulheres no Brasil diminuiu em 10%, e que este índice representa uma esperança de que a situação possa melhorar. Ela afirmou que, atualmente, 94% da população brasileira já ouviu falar da lei Maria da Penha, e que isto contribui para mudar a cultura da impunidade. “Mas ainda temos muito trabalho. Temos que combater a violência obstétrica, a violência institucional contra as mulheres, a violência contra as mulheres negras. Nós, da Defensoria Pública, estamos sempre de braços abertos para ajudar na construção e na implementação de documentos como este, para mudar a realidade deste país”.

A ministra Carmen Lúcia afirmou que não se pode ignorar o diferencial da prática da violência contra a mulher pele sua condição de ser mulher, e que existe a ciência e a consciência de que deve-se dar uma resposta à sociedade. A ministra defendeu que é necessária vontade política e empenho das partes envolvidas para avançar na realização de julgamentos mais rápidos: “A justiça que tarda falha. E, no caso de violência contra a mulher, se tarde, é aplicação da lei, mas não realização de Justiça. Porque as mulheres que sobrevivem têm suas vidas destroçadas pela violência. E as famílias das que não sobrevivem têm que ter como recomeçar. Se não podemos melhorar o mundo para nós, ao menos que deixemos um futuro melhor para as próximas gerações”.

Protocolo de investigação – O Modelo de Protocolo Latino-Americano de Investigação de Mortes Violentas de Mulheres por Razões de Gênero foi elaborado pelo Alto Comissariado de Direitos Humanos da ONU e pela ONU Mulheres no contexto da campanha do Secretário-Geral “UNA-SE pelo fim da violência contra as mulheres”. O protocolo reúne esforços para que as investigações e processos penais integrem fatores individuais, institucionais e estruturais como elementos para entender o crime e, em seguida, responder adequadamente às mortes violentas de mulheres pelo fato de serem mulheres.