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A ONU Mulheres é a organização das Nações Unidas dedicada à igualdade de gênero e o empoderamento das mulheres.

Brasil

Relatório traz novos dados sobre percepção dos direitos humanos e desigualdade de gênero no Brasil



19.01.2024


Estão no ar os resultados da segunda onda da pesquisa “Percepção Social sobre Direitos Humanos e sobre Mulheres Defensoras de Direitos Humanos”, realizada pelo Ipsos Brasil a pedido da ONU Mulheres entre 20 de dezembro de 2022 e 31 de janeiro de 2023. Assim como na primeira fase, conduzida no início de 2021, a segunda fase contou com 1.200 entrevistas feitas por telefone com homens e mulheres maiores de 18 anos nas cinco regiões do país e traz uma análise dos dados em comparação com a primeira onda.

O estudo integra o projeto “Conectando Mulheres, Defendendo Direitos”, financiado pela União Europeia e que contribui para que as mulheres, em toda a sua diversidade, defendam os seus direitos livres de violência e de intimidação. Os objetivos da pesquisa são, principalmente, compreender a percepção da população brasileira sobre direitos humanos e desigualdade de gênero, entender como a desigualdade de gênero estrutural reflete na percepção de direitos humanos, e conhecer a percepção a respeito das mulheres que defendem direitos humanos.

Em 2023, a pesquisa identificou um discreto crescimento no conhecimento sobre direitos humanos quando comparado com os resultados de 2021. Os resultados chamam a atenção para um movimento progressivo de 7% para 8% na aquisição de conhecimento sobre os direitos humanos, com redução percentual de 19% para 16% de respondentes que declararam conhecer “nada ou quase nada” sobre direitos humanos.

Também se manteve elevado o percentual de pessoas que declararam ser favoráveis aos direitos humanos, com 87% das respostas favoráveis em 2023, confirmando os resultados de 2021. O fato de a favorabilidade aos direitos humanos crescer após a exposição das informações indica que a população está se tornando cada vez mais consciente sobre a importância dos direitos humanos.

A defesa da igualdade para todas as pessoas se mantém como o principal significado do que os respondentes entendem por direitos humanos, seja como manifestação espontânea ou estimulada. Em 2021, as respostas sobre o significado de direitos humanos se remetiam a uma ideia abstrata de igualdade de direitos para todas as pessoas (39%), além de fazer referência a direitos básicos como saúde (12%) e educação (11%). Já em 2023, os resultados apontam uma ampliação da compreensão sobre o significado de direitos humanos, com referências ao direito de ir e vir (18%), respeito aos direitos de todas as pessoas independente de raça ou classe social (41%), e direito à vida com 15% de respostas.

Outro ponto de destaque é que nas duas ondas prevaleceu a opinião de que “quem mais se beneficia com os direitos humanos são os bandidos”, mas em 2023 a pesquisa registrou diminuição de 5 pontos percentuais nesse posicionamento em comparação à onda anterior, com queda de 32% para 27%. Houve também diminuição de 5 pontos percentuais na opinião de que as pessoas empobrecidas são aquelas que menos se beneficiam dos direitos humanos, de 40% para 35%. Ou seja, considerando que a associação entre direitos humanos e “proteção a bandidos” é negativa, parece haver uma convergência para uma compreensão mais positiva dos direitos humanos como voltados à proteção de quem necessita, como é o caso das pessoas mais pobres. Em 2023, o percentual das pessoas que alegam que os direitos humanos protegem mais as vítimas (44%) supera os que afirmam que a defesa é maior de criminosos (38%). Para efeitos de comparação, em 2021, 50% das pessoas respondentes concordam que os direitos humanos defendem mais os bandidos.

Além disso, cresce a percepção da população de que os direitos humanos fortalecem a democracia brasileira. Esse índice passou de 60% para 65%. Já o índice de pessoas que refutam essa ideia registrou queda de 9 pontos e agora resulta em apenas 23%.

Quem tem a responsabilidade de defender os direitos humanos?

As Nações Unidas são apontadas pela maioria das pessoas como instituição garantidora dos direitos humanos; seguidas por Organizações Não Governamentais e Movimentos Sociais. As instituições públicas seguem na lista (Poder Judiciário ou Justiça, Estado brasileiro e Poder Legislativo). O setor privado fica em último lugar na percepção das pessoas.

Enquanto aumenta a percepção sobre a responsabilidade em todas as esferas do Poder Público, o setor privado segue menos responsabilizado pela garantia dos Direitos Humanos. Esse dado revela uma lacuna de conhecimento sobre quem são os titulares dos deveres na aplicação dos direitos humanos e apontam para a necessidade de melhor disseminação dessas informações.

Igualdade de gênero

Apesar de a maioria das pessoas respondentes manter um posicionamento favorável à defesa da equidade entre homens e mulheres, há uma redução na segunda onda da pesquisa no apoio ao protagonismo feminino, ao feminismo e à defesa dos direitos iguais para casais homossexuais. Essa redução é mais intensa entre pessoas de baixa renda, de faixa etária mais avançada e menos escolarizadas.

Foi registrada também a percepção negativa que a população tem sobre a igualdade de acesso para mulheres brancas e negras. Grande parte da população não acredita que mulheres brancas e negras têm as mesmas oportunidades e direitos (51% em 2023).

Mesmo com um alto nível de discordância em relação a estereótipos, a misoginia e o sexismo ainda prevalecem em níveis elevados na sociedade brasileira. Esses estereótipos e comportamentos contribuem para perpetuar desigualdades e injustiças de gênero, afetando negativamente a vida das mulheres.

Quem são as mulheres defensoras de direitos humanos?

Segundo a ONU, defensora de direitos humanos é toda mulher que atua pela promoção ou proteção dos direitos humanos e toda pessoa que defende os direitos humanos das mulheres ou trabalha pela igualdade de gênero. Elas podem ser defensoras do meio ambiente, feministas, educadoras, lideranças sindicais ou comunitárias, líderes espirituais ou de povos tradicionais, mulheres na política institucional, profissionais de saúde, trabalhadoras rurais, profissionais do sistema de justiça, jornalistas e comunicadoras, artistas, empreendedoras, entre outras.

Apesar da contribuição dessas mulheres para a democracia e uma sociedade mais justa, a atuação de defensoras de direitos humanos tem sido desde sempre confrontada pela violência. As causas estruturais dessa violência remontam não apenas aos interesses conflitantes em relação às mais diversas pautas em que atuam, mas também ao desvio em relação aos papéis e expectativas sociais tradicionalmente reservados às mulheres.

Nesse sentido, a pesquisa aponta que a percepção mais positiva sobre defensoras de direitos humanos se mantém constante entre as duas ondas, variando de 72% para 75%, mas ainda enfrenta dificuldades em convergir para uma favorabilidade maior. Houve uma redução de concordância sobre o papel das mulheres na luta pelos direitos humanos, principalmente entre homens, pessoas com mais de 60 anos, com menos escolaridade e renda. A percepção de que as mulheres que lutam pelos direitos humanos são intolerantes aumentou.

A pesquisa também revela que a memória espontânea sobre as principais defensoras dos direitos humanos é liderada por Marielle Franco e Maria da Penha. No entanto, 1 em cada 5 das pessoas entrevistadas não conseguiu citar espontaneamente uma liderança feminina que defenda os direitos humanos.

Vemos o aumento no conhecimento sobre temas como misoginia (de 40% para 48%), xenofobia (71% para 76%) e discurso de ódio (78% para 84%), mas com pouco impacto na percepção de gravidade em relação a esses problemas. O racismo é o tema de maior conhecimento e atribuição de gravidade, com 91% das pessoas que responderam apontando-o como um problema grave; a xenofobia, o de menor atenção, com 52%. A população preta percebe mais gravidade em todos os problemas, enquanto a população branca tem os menores índices de atribuição de gravidade às questões de intolerância levantadas pela pesquisa.

Com base nos resultados, é possível observar que a população brasileira possui um conhecimento razoável sobre os direitos humanos, com uma boa parte da população sendo favorável a eles. Entretanto, ainda existem parcelas da população que possuem percepção negativa sobre as pessoas defensoras dos direitos humanos, especialmente em relação às mulheres que defendem esses direitos.

Outro ponto relevante é o aumento do reconhecimento quanto à responsabilidade do Estado pelos direitos humanos, o que está acompanhado pelo crescimento na percepção sobre os direitos fundamentais, como o direito a ir e vir, liberdade de expressão e direito à vida, que elevaria a importância da atuação do Estado na implementação de garantias desses direitos.

Apesar de haver um aumento na percepção sobre os benefícios coletivos que podem ser obtidos com a ampliação dos direitos humanos, ainda existe um tabu em tratar publicamente sobre o assunto. Isso pode ser um reflexo da falta de informação e educação sobre o tema, o que acaba gerando preconceitos e visões distorcidas sobre os direitos humanos.

Dessa forma, embora seja encorajador ver que a favorabilidade aos direitos humanos está aumentando, ainda há trabalho a ser feito para garantir que todos os segmentos da população entendam plenamente a importância desses direitos fundamentais.

Para saber mais, clique aqui e baixe o relatório completo.