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A ONU Mulheres é a organização das Nações Unidas dedicada à igualdade de gênero e o empoderamento das mulheres.

Brasil

Em meio à pandemia, agências da ONU intensificam ações voltadas à saúde de refugiadas e migrantes venezuelanas em Roraima



06.04.2021


No Dia Mundial da Saúde, lembrado neste 7 de abril, ONU Mulheres ressalta a importância da mobilização da rede local de atendimento para garantia de direitos e destaca avanços da ação conjunta com refugiadas e migrantes líderes comunitárias na prevenção da COVID-19

 

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A partir do programa LEAP, agências da ONU levam informação sobre saúde a mulheres refugiadas e migrantes em Roraima (Foto: ACNUR/Allana Ferreira)

 

A garantia do acesso a serviços essenciais de saúde é um desafio constante para organizações e agências que trabalham com população refugiada e migrante no Brasil – situação que tem se agravado com um ano de pandemia de COVID-19. Como forma de amenizar esses efeitos e buscar garantir o acesso à saúde, a ONU Mulheres, em parceria com organizações da sociedade civil, poder público e outras agências do Sistema das Nações Unidas no Brasil, tem investido em iniciativas específicas para mulheres venezuelanas em Roraima. As ações vão de auxílio financeiro a mulheres afetadas diretamente pela pandemia à mobilização do poder público e ao preparo de refugiadas e migrantes para serem multiplicadoras de conhecimento sobre prevenção contra a COVID-19 em suas comunidades.

As ações da ONU Mulheres em Roraima acontecem a partir do programa Liderança, Empoderamento, Acesso e Proteção para mulheres migrantes, solicitantes de refúgio e refugiadas no Brasil (LEAP), conduzido em parceria com o Fundo de População das Nações Unidas (UNFPA) e o Alto Comissariado das Nações Unidas para Refugiados (ACNUR), com apoio do Governo de Luxemburgo. Assinado em 2018 e em implementação desde 2019, o programa tem como objetivo apoiar o governo brasileiro na resposta adequada às necessidades de mulheres refugiadas e migrantes no Brasil.

Foi a partir do LEAP que as três agências da ONU iniciaram, ainda em 2020, a Força-Tarefa de Comunicação com as Comunidades – estratégia de resposta humanitária baseada na facilitação do acesso a informações que salvam vidas por parte das comunidades afetadas, para que as pessoas possam tomar as melhores decisões para si e para as comunidades onde estão inseridas. As ações da Força-Tarefa na capital, Boa Vista, tiveram como objetivo a sensibilização de comunidades venezuelanas sobre os principais sintomas da doença, as medidas de prevenção e as formas de acesso aos serviços públicos de saúde, em caso de suspeita e apresentação de sintomas. “Em cada comunidade foi identificada uma liderança que ficasse responsável por acionar agentes de saúde das Forças Armadas quando uma pessoa apresentasse sintomas dentro das comunidades. No total, foram sensibilizadas 1.244 mulheres e 1.348 homens por 15 organizações, entre agências da ONU e Organizações da Sociedade Civil”, explica a Gerente de Liderança e Participação em Ação Humanitária da ONU Mulheres, Tamara Jurberg.

Fortalecimento local para prevenção contra a COVID-19 – Nessa Força-Tarefa, ONU Mulheres ofereceu acompanhamento remoto e dedicado a 19 venezuelanas líderes comunitárias de 14 localidades, entre abrigos e ocupações espontâneas em Boa Vista. Durante os períodos de maior isolamento social em 2020, essas lideranças tiveram papel fundamental na realização de atividades de sensibilização sobre prevenção e identificação de sintomas de COVID-19.  Por serem mulheres, e diante do aumento significativo dos casos de violência doméstica, as lideranças também foram preparadas para abordar assuntos como igualdade de gênero, prevenção, mitigação e resposta à violência contra mulheres. No total, 565 pessoas foram sensibilizadas por essas migrantes e refugiadas líderes comunitárias apenas em 2020.

A jovem Yolimar Avila, de 25 anos e mãe de duas crianças, foi uma dessas lideranças capacitadas. Até janeiro de 2021, ela morava em uma ocupação espontânea na capital. Venezuelana indígena da etnia warao, ela conta que a preparação recebida durante a Força-Tarefa fez diferença para abordar outras mulheres indígenas da comunidade e para multiplicar conhecimento sobre prevenção e identificação dos sintomas de COVID-19 na ocupação.

“Uma dificuldade que enfrentamos naquele momento é que as mulheres indígenas não acreditam nos médicos. Acreditam apenas em orações, no nosso rastro de cultura. Então, coube a mim a responsabilidade de tentar mudar isso. Pouco a pouco fui conversando com as mulheres, compartilhando informação, até que chegamos a um momento que todas aceitaram que era uma pandemia. E isso aconteceu quando algumas pessoas de dentro da ocupação, pessoas indígenas, começaram a adoecer”, lembra Yolimar. “Para aquele momento, se uma pessoa viesse de fora, não teríamos tido o mesmo impacto. Depois que as mulheres começaram a ver pessoas doentes lá dentro da ocupação, eu e a outra mobilizadora tivemos uma responsabilidade muito grande de dar exemplo e compartilhar informação”, completa.

O resultado, segundo Yolimar, foi uma mudança no comportamento e poucos casos de infecção pela COVID-19 entre a população warao daquela comunidade. “Falávamos nas conversas que era preciso prevenção, porque a doença já havia chegado ao nosso espaço. E para as pessoas que não entendiam espanhol, eu falava no idioma warao. Tudo isso era muito sério e as mulheres captaram isso de verdade. Passaram a usar máscaras, a passar álcool em gel nas mãos e a cuidar  mais da higiene das crianças”, comenta.

Apoio financeiro a famílias afetadas pela pandemia – Outra iniciativa importante a partir do programa LEAP durante a pandemia é a identificação e o apoio a mulheres e famílias afetadas diretamente pela COVID-19. Por meio do programa emergencial de apoio financeiro oferecido pelo programa, conhecido como CBI (da sigla em inglês para Cash Based Intervention) , mulheres estão sendo identificadas para o recebimento do valor de R$ 700.  Ainda no primeiro semestre de 2021, cerca de 250 terão recebido o benefício. Entre essas mulheres estão algumas que foram infectadas pela COVID-19 e lidam com as sequelas e outras que perderam pessoas da família e, em decorrência disso, estão sofrendo grande impacto econômico”, explica a gerente de Empoderamento Econômico em Ação Humanitária da ONU Mulheres em Roraima, Flávia Muniz. “Esse recurso tem como objetivo amenizar o impacto imediato da pandemia sobre essas mulheres, que já eram as principais responsáveis pelo orçamento familiar ou acabaram responsáveis por manter a família agora, em decorrência da perda de cônjuges ou demais familiares que auxiliavam na renda. É um auxílio pontual e único, mas de grande impacto no atendimento de necessidades básicas e urgentes”, completa.

Yuliska Bautista tem 27 anos, é casada e mãe de um menino de sete. Ela, o esposo e o filho contraíram a COVID-19 há pouco tempo e ainda sofrem com as sequelas da doença, tanto na vida financeira quanto na saúde física. O casal está desempregado e Yuliska tem encontrado dificuldades em tratar os efeitos secundários da doença, como cansaço e tonturas constantes.  “É muito difícil nosso dia a dia sem um emprego, porque temos contas para pagar, precisamos nos alimentar. Mesmo depois de curada, sigo com crises de labirintite, e há dias que sequer consigo sair da cama”, conta. “A situação de saúde está difícil com a pandemia, e precisei fazer uma consulta particular com um otorrino para conseguir ser atendida e tentar resolver meu problema. O pouco dinheiro que tínhamos, usei para a consulta e o tratamento”, ressalta. Com o benefício recebido, a família conseguirá comprar alimentos e ter mais cuidado com a saúde.

Além dos CBIs, o programa também tem apoiado o desenvolvimento de grupos de empreendedorismo em Boa Vista, como cooperativas de mulheres costureiras, brasileiras e venezuelanas. Com o apoio de ONU Mulheres, essas cooperativas têm se dedicado à produção de equipamentos de proteção individual para serem vendidos e doados para a comunidade.

Preparação local para desafios constantes – Com o aumento nos casos de violência contra mulheres durante o isolamento social, equipes das redes de proteção e atendimento a mulheres em Roraima têm sido sensibilizadas para a identificação e o acolhimento de mulheres sobreviventes de violência doméstica. Durante o período da pandemia, equipes médicas que trabalhavam no hospital de campanha de Roraima e nas clínicas móveis de atenção primária foram capacitadas em gênero e violência baseada no gênero por ONU Mulheres, ACNUR e UNFPA. No total, 31 pessoas de diferentes organizações participaram dessas formações, como Associação Voluntários para o Serviço Internacional (AVSI), Médicos Sem Fronteiras (MSF), Forças Armadas e Organização Internacional para as Migrações (OIM). O objetivo é que essas pessoas multipliquem o conhecimento e estejam preparadas para identificação de possíveis sinais de violência, encaminhando os casos à rede especializada de proteção.

Para além do período de pandemia, o tema da saúde entre a população refugiada e migrante se mostra como um desafio constante. A garantia da proteção integral mesmo para as pessoas com dificuldade de regularização migratória ou renovação de documentos vencidos durante a pandemia da COVID-19, a expansão do acesso ao Sistema Único de Saúde (SUS) e o apoio à prestação de serviços durante o processo de interiorização estão entre as prioridades para a área no Plano de Resposta a Refugiados e Migrantes para 2021 (RMRP 2021, da sigla em inglês). A partir dessa demanda, a ONU Mulheres tem promovido rodas de conversa e ações de sensibilização dentro dos chamados Espaços Seguros – que, durante a pandemia, passaram a ser usado com essa atuação com lideranças.  Neles, mulheres refugiadas e migrantes, além de brasileiras das comunidades de acolhida, podem trocar experiências e construir juntas soluções para demandas comuns e do mapeamento de necessidades, inclusive na área de saúde.

“Em diversas localidades, a temática da saúde se faz presente e são feitas discussões sobre o acesso ao SUS, atenção básica, saúde sexual e reprodutiva e acesso a tratamentos de doenças mais graves. Neste último caso, ONU Mulheres chegou a mobilizar a área especializada de saúde da Defensoria Pública do Estado de Roraima para garantir o acesso de refugiadas e migrantes a tratamentos de câncer não apenas em Roraima, mas também para oportunizar a interiorização de mulheres que precisavam de tratamentos específicos não disponíveis no estado”, ressalta Tamara Jurberg.

Sobre o programa conjunto LEAP – Conduzido por ONU Mulheres em parceria com o Fundo de População das Nações Unidas (UNFPA) e o Alto Comissariado das Nações Unidas para Refugiados (ACNUR), com financiamento do Governo de Luxemburgo, o programa conjunto Liderança, Empoderamento, Acesso e Proteção para mulheres migrantes, solicitantes de refúgio e refugiadas no Brasil (LEAP) foi assinado em 2018 e está em implementação desde 2019. O programa se estabelece em três frentes: Liderança e Participação, Empoderamento Econômico, e Fim da violência contra mulheres e meninas. Junto com o Sistema das Nações Unidas no Brasil, organizações da sociedade civil e ONGs envolvidas na resposta humanitária, o LEAP busca o fortalecimento e coordenação de atores humanitários e poder público, o desenvolvimento de capacidades de organizações locais e a criação de espaços seguros, positivos e de resiliência para mulheres migrantes e refugiadas conseguirem a boa convivência com as comunidades locais. Dentro do cenário da pandemia de COVID-19, também tem oferecido apoio a mulheres líderes comunitárias, migrantes e brasileiras. Junto a instituições de ensino, ao Governo Federal por meio da Operação Acolhida, e com o engajamento do setor privado, o programa LEAP também promove ações a integração socioeconômica de migrantes e refugiadas venezuelanas. As atividades incluem qualificação profissional, auxílio financeiro, mentoria, apoio a grupos de mulheres empreendedoras e busca ativa por vaga formais de trabalho.