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A ONU Mulheres é a organização das Nações Unidas dedicada à igualdade de gênero e o empoderamento das mulheres.

Brasil

Discurso de abertura da diretora executiva ONU Mulheres na 62ª Sessão da Comissão da ONU sobre a Situação das Mulheres



13.03.2018


Phumzile Mlambo-Ngcuka é Secretária-Geral Adjunta da ONU e Diretora Executiva da ONU Mulheres

 

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Solenidade de abertura da 62ª Sessão da Comissão da ONU sobre a Situação das Mulheres 
Foto: ONU Mulheres/Ryan Brown

Senhor Presidente da Comissão sobre a Situação das Mulheres,

Senhor Secretário Geral das Nações Unidas, ainda que em ausência,

Senhor Presidente do Conselho Econômico e Social,

Senhor Presidente da Assembleia Geral,

Damos as boas vindas aos Ministros de Estado aqui presentes, incluindo a ex-ministra da Suécia e hoje Secretária-Adjunta das Nações Unidas atuando na ONU Mulheres, Ăsa Regnér,

Mulheres e meninas ativistas de áreas rurais, bem como representantes de ativistas que trabalham em áreas rurais,

Colegas, senhoras e senhores.

Bem-vindos à sexagésima segunda sessão da Comissão sobre a Situação das Mulheres da Organização das Nações Unidas.

O foco deste ano nas mulheres e meninas que vivem em áreas rurais deve ser uma das temáticas mais importantes sobre as quais a CSW já se debruçou. É parte integrante das metas para alcançarmos os objetivos constantes na Agenda para o Desenvolvimento Sustentável de 2030.

Esta temática diz sobre nosso compromisso de lutar contra alguns dos maiores desafios do nosso tempo: a pobreza, a desigualdade, a interseccionalidade e o fim da violência e da discriminação contra mulheres e meninas, independentemente de onde ou como vivem, para que ‘não deixemos nenhuma para atrás’.

Em todo o mundo, quase um terço das mulheres empregadas trabalham na agricultura. Existem 400 milhões de mulheres que são trabalhadoras agrícolas. Elas trabalham principalmente como pequenas produtoras e agricultoras, ou como trabalhadoras informais, com pouca ou nenhuma proteção social, e quase sem visibilidade. Mas o mundo só se alimenta todos os dias porque elas trabalham.

Em todo o mundo, milhões de mulheres e meninas nas áreas rurais são responsáveis pelos cuidados não remunerados em suas casas, zelando por suas famílias, mas perdendo oportunidades para seu próprio crescimento.

Esta Comissão espera mudar essa realidade.

Nossa recente pesquisa sobre a implementação dos Objetivos para o Desenvolvimento Sustentável e o relatório preparado pela Secretaria-Geral das Nações Unidas para esta Sessão mostram como as mulheres nas áreas rurais estão em desvantagem em todos os indicadores de gênero e desenvolvimento em relação aos quais há dados disponíveis.

Enquanto as mulheres em muitas regiões constituem até 60% da força de trabalho agrícola em todo o mundo, apenas 13% delas são proprietárias das terras nas quais trabalham, com desequilíbrios de poder que as privam do controle sobre a renda que geram, sobre suas vidas e sobre seus corpos.

Ainda, em quase dois terços dos países, mesmo sendo produtoras de alimentos, as mulheres estão mais propensas que os homens à insegurança alimentar e à fome.

Apenas 20% das mulheres nas áreas rurais têm acesso à água potável, frente a 68% das suas conterrâneas urbanas.

Metade de todas as mulheres rurais pobres nos países em desenvolvimento não têm acesso à alfabetização básica, e 15 milhões de meninas em idade escolar nunca – nunca – terão a chance de aprender a ler ou escrever na escola primária.

Uma menina rural tem duas vezes mais chances de ser submetida a um casamento durante a infância do que uma conterrânea de áreas urbanas. Sem educação adequada e conhecimento, sua autonomia, capacidade de controlar suas próprias vidas e escapar da violência são drasticamente reduzidas.Sobretudo, são essas mulheres e meninas que vivenciam múltiplas e interseccionadas formas de discriminação, que sofrem o peso do preconceito e da exclusão.

São mulheres idosas, mas também jovens e meninas, são aquelas que vivem com deficiências, com orientação sexual não aceita, são mulheres indígenas e defensoras de direitos humanos.

A maternidade e a condição de refugiadas colocam essas mulheres ainda em maior risco.

Esses problemas e outros preocupam as organizações de mulheres. Mas sua capacidade de ação limitada resulta que essas organizações não podem fornecer soluções de longo alcance, na escala necessária, e promover as mudanças desejadas.

A parceria das Nações Unidas com vocês, que também estão preocupadas com esses problemas, é essencial.

Nosso último Relatório de Monitoramento sobre a Implementação dos Objetivos para o Desenvolvimento Sustentável destacou o perigo visível que é a desaceleração do progresso nas condições de vida das mulheres e até mesmo a reversão de alguns dos ganhos que atingimos.

Somado a isso, o Relatório Global sobre a Desigualdade de Gênero produzido pelo Fórum Econômico Mundial em 2017 informa que as disparidades no acesso à saúde, à educação, à participação política e ao mercado de trabalho aumentaram, pela primeira vez desde que os registros começaram ser produzidos, em 2006.

O Relatório do Fórum prevê – ouçam isso – que vai demorar 217 anos para alcançarmos a paridade de gênero. Não no nosso tempo. Eu repito: levará 217 anos para atingirmos a paridade de gênero.
Nunca foi tão urgente nos responsabilizarmos a nós mesmos e a nossos líderes pelos compromissos em acelerar esse progresso.

Hoje, ao abrirmos a sessão deste ano da Comissão das Nações Unidas sobre a Situação das Mulheres, devemos enxergar este fórum como a maior oportunidade para garantir e acelerar o progresso urgente aos direitos das mulheres, construir consensos e compartilhar as melhores práticas que permitam que a Comissão atenda às mais pobres entre os pobres, com urgência e a máxima responsabilidade para com aquelas que mais precisam da CSW.

Este é o momento para um ponto de inflexão.

É o momento para estabelecer ações que respondam à grandeza dos problemas enfrentados pelas mulheres que vivem em áreas rurais.

As mulheres estão lutando para tomar medidas que transformem suas vidas, e se recusam a aceitar as práticas que normalizam as desigualdades de gênero, as más condutas sexuais, a exclusão e a discriminação em todos os quadrantes de suas vidas.

Em todo o mundo, estamos testemunhando um desejo sem precedentes por mudanças nas vidas das mulheres, e um crescente reconhecimento de que quando as mulheres se juntam podem produzir mudanças de longo alcance.

Eles acreditam que “o tempo é agora”, para promover mudanças e impor responsabilidades para acabar com a impunidade. As mulheres também vêm conseguindo demonstrar que as ações que elas realizam juntas podem impactar nas ações de outros atores.

Na semana passada, a Google divulgou novos dados de seu mecanismo de busca global. Em 2017, o mundo pesquisou mais do que nunca sobre “direitos das mulheres” – com um aumento de mais de 700% no mês de janeiro.

Esta Comissão não precisa procurar o significado dos direitos das mulheres. Nós conhecemos as definições deles; só precisamos de ação.

Nosso papel é agir com propósito comum, compartilhar a compreensão de nossa urgência, e dar passos ousados para efetivar os compromissos e transformar as palavras em ações e em uma realidade vívida.

E precisamos correlacionar direitos e desenvolvimento. Como todos nós, as pessoas nas zonas rurais precisam de ambos e merecem também viver em paz.

Eu exorto esta Comissão: a encontrar respostas; a reunir diferentes pontos de vista em um processo de respeito mútuo; a concordar com as constatações que mostram que estamos aqui especialmente para nos dedicarmos ao 1 bilhão de pessoas que vivem em condições de extrema pobreza.

As mulheres nas áreas rurais precisam de tecnologias inovadoras e conectividade; de saneamento básico, água potável, energia e transporte, mobilidade e apoio à produtividade. Eles precisam de acesso a crédito, justiça climática, mercados e cadeias agroalimentares de alto valor. Elas precisam da extinção de leis e normas discriminatórias que sustentam práticas culturais prejudiciais, como as mutilações genitais e os casamentos forçados e precoces. Elas precisam de respeito à sua saúde e seus direitos sexuais e reprodutivos. E precisam que seja posto fim à violência em todas as suas formas.

Isso é verdadeiro para todas as comunidades e instituições, incluindo as Nações Unidas, onde o Secretário-Geral deixou claro que não há espaço para violência de gênero e assédio de qualquer tipo.

Em todo o mundo, milhões de mulheres são deslocadas de suas casas e expostas à violência sexual em conflitos, inclusive por parte das forças de segurança destinadas a protegê-las. Esta é também uma questão crítica e, novamente, uma área onde as mulheres esperam ações de nossa parte. Elas, que experimentam o tráfico sexual e estão expostas ao feminicídio.

Nós congratulamos, portanto, o novo e importante impulso dado para abordar as principais formas de violência: a recentemente destacada iniciativa da União Europeia e da ONU, sob a orientação do Secretário-Geral e da Secretária-Geral adjunta, para prover significativos investimentos no combate à violência contra mulheres e meninas na Ásia, África e América Latina e Caribe.

Isso será feito em colaboração com as agências da ONU, incluindo a ONU Mulheres, Fundo de População das Nações Unidas (UNFPA), Programa das Nações Unidas para o Desenvolvimento (PNUD) e Organização Internacional do Trabalho (OIT). Juntamente com os nossos principais aliados na sociedade civil, podemos inverter essa maré. Este é o tipo de desenvolvimento bem-vindo.

A inversão de tendências e o progresso sustentado requerem uma forte liderança. Aqui nas Nações Unidas, o Secretário-Geral nos mostrou o que pode ser alcançado com uma liderança decisiva e ação direcionada.

Como ouvimos, pela primeira vez nos 72 anos da Organização das Nações Unidas, há paridade de gênero na equipe de gerenciamento sênior. Isso demonstra que com uma liderança forte a mudança é possível. E ressalta o quão importante é ter líderes que se coloquem à frente dos processos.

A ONU também sublinha que homens e meninos em todos os lugares também fazem parte desta jornada de mudança. E destaca que as transformações radicais, às vezes, são o único caminho.

Os movimentos “Me Too” e “Time’s up” também nos mostraram que a mudança pode acontecer rapidamente. E que as mulheres devem ser acreditadas.

Este é um momento que pretendemos sustentar para todas.

O devido processo é importante, mas devemos lembrar que apenas um punhado de homens experimentaram até agora as consequências de suas ações, enquanto um bilhão de mulheres ainda vivem com os efeitos duradouros da violência.

Suas histórias precisam ser contadas.

Esta CSW nos oferece uma plataforma histórica para uma nova dinâmica de mudanças.

Tem a maior representação de base de todos os tempos, graças às delegações que responderam positivamente ao pedido de incluir mulheres e meninas das áreas rurais em suas delegações e na Cúpula da Juventude.

Temos a oportunidade de ouvir as mulheres rurais diretamente, e falar com elas, para que não falemos apenas sobre elas e para elas. Elas estão aqui porque esta Sessão é sobre suas vidas e sobre nosso futuro compartilhado.

Quando a Carta das Nações Unidas se refere a “Nós, os povos”, significa também todas essas mulheres e todas as suas vozes.

Como qualquer um de nós, elas querem escolher quando ter um filho, qual o tamanho de sua família e quem elas querem amar.

Elas também querem uma vida sem violência, ser ouvidas e se livrar da fome.

Eles são sobreviventes, são resistentes, são corajosas e estão cheias de sonhos.

Não peçamos que se contentem com menos ou esperem mais.

Este é o tempo delas para ‘Nós, os povos’.

Elas precisam de vocês para se unirem em torno de uma causa comum, conforme estabelecido nos princípios de igualdade entre todos em nossa Carta Fundadora.

Eu, respeitosamente, os incito a fazer deste momento um ponto de aceleração real, mudança e responsabilidade.

Obrigada.