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Brasil

“O compromisso do Brasil tem que ser com os nossos direitos”, diz Sônia Guajajara, do movimento de mulheres indígenas



22.12.2015


Participante da 1ª Conferência Nacional de Política Indigenista, ela ressalta a oportunidade de diálogo e articulação para a garantia de direitos e é categórica: “O nosso recado é que não vamos e não podemos abrir mão dos direitos. Não vamos abrir mão da nossa terra. O Estado brasileiro tem a obrigação de demarcar as terras indígenas. Tem a obrigação de cumprir a Constituição Federal. Independente de crise política e financeira, o nosso compromisso é com a nossa pauta. E o compromisso do Brasil tem que ser com os nossos direitos”. Leia a primeira da série de cinco entrevistas com as ativistas do Voz das Mulheres Indígenas

Assista aqui a série de depoimentos de mulheres indígenas participantes do projeto Voz das Mulheres Indígenas no Youtube da ONU Mulheres Brasil
Confira aqui a galeria de fotos do projeto Voz das Mulheres Indígenas

 

“O compromisso do Brasil tem que ser com os nossos direitos”, diz Sônia Guajajara, do movimento de mulheres indígenas/

Sônia Guajajara é membro da Articulação dos Povos Indígenas do Brasil
Fotos: Isabel Clavelin/ONU Mulheres

 

Empoderamento e incidência política. Estas são palavras de ordem que o Grupo de Referência e as Multiplicadoras do projeto Voz das Mulheres Indígenas têm propagado nas aldeias indígenas brasileiras. A iniciativa conta com a assessoria técnica e apoio da ONU Mulheres Brasil e da Embaixada da Noruega.

Desde junho de 2015, 22 lideranças do movimento de mulheres indígenas estão atuando para identificar as demandas de outras mulheres indígenas, articulando pauta política que possa ser representantiva da maior parte dos 305 povos existentes no país. Em 13 de dezembro, o Grupo de Referência e as Multiplicadoras do projeto Voz das Mulheres Indígenas reuniram-se em Brasília, na Casa da ONU Brasil, para fazer um balanço das ações.

Até o momento, mulheres indígenas de 56 povos já posicionaram a sua visão sobre violação de direitos; empoderamento político; direito à terra e processos de retomada; direito à saúde, educação e segurança; tradições e diálogos interageracionais. O levantamento das demandas tem sido feito em visitas às aldeias e a espaços políticos, tais como as etapas preparatórias das Conferências de Política Indigenista, de Políticas para a Juventude e de Políticas para as Mulheres.

Uma das principais lideranças do projeto Voz das Mulheres Indígenas é Sônia Guajajara, integrante da Articulação dos Povos Indígenas do Brasil (APIB). Ela explica que o projeto Voz das Mulheres Indígenas tem colaborado para “tentar unificar uma pauta, trazer as mulheres não fisicamente, mas com suas ideias e demandas. A gente tem isso para definir qual a pauta comum das mulheres indígenas brasileiras, tentando alcançar a diversidade étnica e cultural no sentido de ver qual é a nossa demanda e como podemos atuar com maior participação e incidência das mulheres em todos os processos de decisão e discussão”.

Sônia é da povo Tenetehara e nascida no Maranhão. Dentre as demandas políticas dos povos indígenas no país, ela destaca a garantia de direitos para “não permitir o retrocesso dos direitos adquiridos na Constituição Federal. A principal luta continua sendo a garantia do território, porque a partir daí a gente consegue garantir as outras políticas sociais, culturais e políticas para as mulheres. A gente não tem saúde diferenciada para as mulheres indígenas. Há especificidades que precisam ser atendidas”.

 

“O compromisso do Brasil tem que ser com os nossos direitos”, diz Sônia Guajajara, do movimento de mulheres indígenas/

Articuladoras do projeto Voz das Mulheres Indígenas reuniram, na Casa da ONU Brasil, em Brasília

 

Um dos espaços para a reivindicação de direitos é a Conferência Nacional de Política Indigenista, que se se encerrou em 17 de dezembro, em Brasília. O tema central da conferência foi “A relação do Estado Brasileiro com os Povos Indígenas no Brasil sob o paradigma da Constituição de 1988”. Para Sônia Guajajara, a garantia dos direitos constitucionais é um desafio para o Brasil.

“Temos observado que a relação do Estado brasileiro é ainda muito distante dos povos indigenas, não respeita a diversidade, os direitos, as especificidades nem a presença dos povos originários. Esse tema é para a gente discutir isso. Como estamos sendo tratados dentro de um país em que somos os verdadeiros donos. A conferência foi um processo importante de diálogo e conversa. Conseguiu alcançar a diversidade de povos e terras indígenas. Nesse momento difícil de conjuntura política e de ataque aos povos indígenas, foi um momento muito oportuno para avaliar a ação indigenista do Estado brasileiro, mas também de propor novas diretrizes, reafirmar nossos direitos e também para pensarmos nossas estratégias, dos movimetnos e povos indígenas, para fazer esse enfrentamento político”, afirma.

Bastante categórica, Sônia vai direto ao ponto na defesa dos direitos dos povos indígenas brasileiros. “O nosso recado é que não vamos e não podemos abrir mão dos direitos. Não vamos abrir mão da nossa terra. O Estado brasileiro tem a obrigação de demarcar as terras indígenas. Tem a obrigação de cumprir a Constituição Federal. Independente de crise política e financeira, o nosso compromisso é com a nossa pauta. E o compromisso do Brasil tem que ser com os nossos direitos”, pontua.

Identidade e territorialidade – Na entrevista ao site da ONU Mulheres Brasil, Sônia Guajajara é reveladora dos valores culturais e da cosmovisão indígena sobre território, que transpõem a compreensão material das terras indígenas.

“Para nós, território é todo o conjunto. É o universo, onde estão todas as coisas que garantem a nossa sobrevivência, o exercício do nosso modo de vida no sentido cultural, político e a relação íntima com a natureza e meio ambiente. Não é terra, lote ou bem que se quer para vender. É espaço onde se tem relação muito íntima com a água, o sol, a lua, as estações, as árvores. É todo esse conjunto. Não tem como falar em território se não se tem todo esse conjunto livre. A gente sempre diz que indío sem território deixa de existir. Sem território não temos como manter viva a nossa identidade. É a partir disso que a gente consegue nos reafirmar e nos manter como povos indígenas”, considera.

E detalha a relação entre território e gênero: “Para as mulheres, isso é ainda mais forte. Para nós, terra é como mãe. A terra é a nossa mãe, a nossa protetora. É uma relação sagrada e onde temos tudo. A gente acredita que a terra é que dá toda a força para as mulheres atuarem e exercerem o seu próprio jeito”.

 

“O compromisso do Brasil tem que ser com os nossos direitos”, diz Sônia Guajajara, do movimento de mulheres indígenas/

Projeto Voz das Mulheres Indígenas tem o apoio da ONU Mulheres Brasil e da Embaixada da Noruega

 

Sobre o Voz das Mulheres Indígenas – Por demanda das mulheres indígenas, a ONU Mulheres Brasil colaborou para a elaboração do projeto Voz das Mulheres Indígenas, numa cooperação com a Embaixada da Noruega, com o propósito de apoiar a incidência política. O projeto tem como objetivo identificar pauta comum de atuação política, norteando-se por cinco eixos: violação dos direitos das mulheres indígenas; empoderamento político; direito à terra e processos de retomada; direito à saúde, educação e segurança; e tradições e diálogos intergeracionais. O processo de coleta de informações e resposta ao questionário será concluído em fevereiro de 2016. Mulheres indígenas interessadas em colaborar, podem entrar em contato por meio do e-mail: mulheres.indigenas@unwomen.org

Mobilização das indígenas – As primeiras organizações de mulheres indígenas surgiram na década de 1980: Associação de Mulheres Indígenas do Alto Rio Negro e Associação de Mulheres do Distrito de Taracuá. Contribua, resgatando o histórico dessas e de outras organizações de mulheres indígenas existentes do seu povo, estado e região.

Povos indígenas no Brasil – Conforme o censo de 2010, cerca de 900 mil indígenas vivem no Brasil. Destes, 450 mil são mulheres e têm menos de 22 anos. A população indígena brasileira está dividida em 305 etnias que falam 274 línguas.

Confira as entrevistas em vídeo:

Andreia Lourenço – Povo Guarani Nhandewa |Paraná

Iara Esmínia – Povo Wasso | Alagoas

Maria Leonice – Povo Tupari | Rondônia

Simone Eloy Amado – Povo Terena | Mato Grosso do Sul

Sônia Guajajara – Povo Tenetehara| Maranhão

 

Leia também:

“O compromisso do Brasil tem que ser com os nossos direitos”, diz Sônia Guajajara, do movimento de mulheres indígenas – perfil de Sônia Guajajara

Mulheres indígenas estão na luta pela terra e sofrem ameaças de madereiros – perfil de Maria Leonice Tupari

Entre a aldeia e a universidade, a terena Simone Amado é uma das articuladoras políticas indígenas no Centro-Oeste – perfil de Simone Amado

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