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Brasil

Parte 3 – Da terra à voz: histórias de cinco mulheres indígenas que produzem conhecimento e lutam pelos direitos humanos



27.04.2023


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A luta pelo direito à participação efetiva na política e em assuntos públicos; assim como a luta pelo direito à cultura, saúde, trabalho, educação, alimentação e à um meio ambiente sustentável é uma constante na vida das mulheres indígenas. Entre diferentes culturas, etnias, sonhos, conquistas e desafios de ser mulher indígena, as histórias de muitas mulheres se entrelaçam e nos mostram a força de um grito coletivo, que constrói conhecimento como forma de resistência e empoderamento.

Inspirada na trajetória de 5 mulheres indígenas que fazem do trabalho uma ferramenta de construção do empoderamento coletivo, a série de matérias “Da terra à voz: histórias de cinco mulheres indígenas que produzem conhecimento e lutam pelos direitos humanos” traz um pouco da força de mulheres que costuram raízes e fazem da união entre cada uma delas um tecido de histórias e sabedorias coletivas.

Maria Pankararu, do Povo Pankararu (PE)  

Parte 3 – Da terra à voz: histórias de cinco mulheres indígenas que produzem conhecimento e lutam pelos direitos humanos/mulheres indigenas direitos humanos direitosdasmulheres Maria das Dores de Oliveira, também conhecida como Maria Pankararu, nasceu na Aldeia Brejo dos Padres, no município de Tacaratu, no sertão pernambucano. Mulher indígena, mãe e professora, ela lembra do desafio da sobrevivência da família enquanto criança e da dependência das chuvas, que muitas vezes não chegavam.  

Maria se formou no magistério e começou a lecionar na sua aldeia. Os desafios, assim como as aprendizagens, foram muitos. “Sempre questionei a distância (cultural) entre a escola e a comunidade. Por isso, sempre busquei caminhos de aproximação. Não fazia sentido trabalhar conteúdos tão alheios à nossa realidade”, conta. Ela intensificou ainda mais sua atuação política quando começou a trabalhar na área de educação da Fundação Nacional dos Povos Indígenas (Funai), para atuar junto aos povos indígenas de Alagoas – muitos oriundos dos Pankararu, como os povos Kalankó, Karuazu, Koiupanka e Jeripankó.

Ela cursou Pedagogia e, na sequência, mestrado e doutorado em Letras e Linguística, na Universidade Federal de Alagoas (UFAL). Maria Pankararu também foi professora substituta da UFAL durante dois anos, no mesmo período em que foi conselheira do Conselho Nacional de Educação, representando os povos indígenas.

“Quando entrei na universidade, era a realização de um sonho muito distante de nossas realidades e quase impossível de ser alcançado, pois as universidades públicas eram de difícil acesso para entrar e mesmo chegar até elas, porque só existiam nas capitais. Durante muito tempo do meu período de formação, fui a única indígena na UFAL”, enfatiza a professora.  

Ela também destaca a importância da representação coletiva: “Quando defendi a minha tese, na qual fiz a descrição da língua indígena Ofayé, muitos de meus parentes por esse Brasil afora me viram como uma esperança concreta de ocupar esses espaços quase inatingíveis por nós, sobretudo por uma mulher indígena, nordestina que quase não tem chance de ascender socialmente nos estudos e trabalho. Então foi uma vitória pessoal, mas também coletiva”.  

Maria também fala sobre ancestralidade, gerações e a força das mulheres Pankararu, que têm um papel de destaque nos ensinamentos e importantes rituais Pankararu. “No meu povo, as mulheres têm muito espaço de poder e muitas são lideranças importantes. Talvez, o fato da mulher Pankararu poder ser uma mãe de Praiá (os praiás representam os nossos Encantados) favoreça a liderança plena feminina. As lideranças tradicionais Pankararu são os pais e mães de praiá e são eles que dão o tom dos rituais, bastante corriqueiros na minha comunidade. Toda a nossa existência é mediada pelos ensinamentos e valores culturais que aprendemos de geração a geração e as mulheres têm um papel de destaque nesses ensinamentos”. Ela ainda acrescenta que, embora toda essa fortaleza e liderança feminina seja real, isso não impede que o machismo seja também vigente na comunidade.  

Ao falar sobre a voz das mulheres indígenas, que cada vez mais reivindicam seus direitos, Maria também fala do respeito à natureza, à terra e ao cuidado com o outro: “Acho que o mundo está precisando escutar o chamado de nossa Mãe Terra, que se traduz em respeitar todos os seres vivos, os rios, mares, florestas. Para nós, cada um desses seres tem vida própria e faz parte de nós. Por isso, a destruição do meio ambiente é a nossa própria destruição”.  

Por Íris Cruz, consultora da ONU Mulheres Brasil