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A ONU Mulheres é a organização das Nações Unidas dedicada à igualdade de gênero e o empoderamento das mulheres.

Brasil

Plano de resposta à crise humanitária venezuelana intensifica ações para igualdade entre mulheres e homens em 2021



28.04.2021


Pela primeira vez, todos os setores da Plataforma de Resposta priorizarão necessidades específicas de mulheres; participação de migrantes e refugiadas na elaboração de documento também é diferencial 

 

Mais de 5,4 milhões de pessoas saíram da Venezuela em busca de condições dignas para sobrevivência, segundo dados de novembro de 2020. Desse contingente, 4,6 milhões vivem como migrantes ou refugiadas em países da América Latina. A liderança de ONU Mulheres na resposta à crise migratória venezuelana se dá a partir do programa Liderança, empoderamento, acesso e proteção para mulheres migrantes, solicitantes de refúgio e refugiadas no Brasil (LEAP), conduzido em parceria com o Fundo de População das Nações Unidas (UNFPA) e o Alto Comissariado das Nações Unidas para Refugiados (ACNUR), com financiamento do Governo de Luxemburgo.  

O programa tem como objetivo apoiar o governo brasileiro na resposta adequada às necessidades de mulheres migrantes e refugiadas no Brasil. A partir dessa atuação e liderança, ONU Mulheres também integra a Plataforma Regional de Coordenação Interagencial que dirige e coordena a resposta a refugiados e migrantes venezuelanos na América Latina (R4V). O Plano de Resposta a Refugiados e Migrantes 2021 (RMRP 2021, da sigla em inglês) é um dos produtos elaborados a partir da integração por meio da plataforma R4V. A íntegra do RMRP 2021 está disponível em rmrp.r4v.info 

“A complexidade da situação migratória de venezuelanos e venezuelanas atualmente exige a incorporação da perspectiva de gênero, já que mulheres e homens apresentam necessidades diferentes, assim como a população LGBTQI+ tem demandas específicas”, considera a representante da ONU Mulheres Brasil, Anastasia Divinskaya. “Quando olhamos para essas particularidades desde o desenho, passando pela implementação, monitoramento e avaliação de projetos e programas de resposta à emergência migratória, conseguimos fazer com que a desigualdade não se perpetue. O objetivo imediato é garantir que haja um justo acesso à assistência para que, ao final, consigamos alcançar a igualdade de gênero, completa Divinskaya. 

Plano de resposta e parceriasPara atender ao maior êxodo da história recente na região, 158 organizações de 17 países, junto com governos locais, sociedade civil, doadores e as próprias pessoas migrantes, elaboraram o Plano de Resposta a Refugiados e Migrantes 2021. O documento está construído a partir da da Plataforma de Coordenação de Resposta a Migrantes e Refugiados da Venezuela (R4V) e 11 setores prioritários: educação; segurança alimentar; saúde; transporte humanitário; integração; nutrição; proteção (incluindo proteção de crianças, violência baseada em gênero, e tráfico e contrabando de pessoas); abrigamento; água, saneamento e higiene (WASH, da sigla em inglês); e serviços comuns (como financiamento, comunicação e gestão de informação). No Brasil, ele conta com o compromisso de nove agências das Nações Unidas, 6 organizações não-governamentais internacionais, 5 ONGs nacionais e 14 organizações de outra natureza – sociedade civil, organizações baseadas na fé e universidades. 

Com maior integração sobre temas de gênero para melhorar a efetividade da resposta como um todo, o Plano avalia e destaca necessidades prioritárias apontadas por mulheres venezuelanas. Um dos exemplos são ações de apoio ao acesso de pessoas migrantes e refugiadas venezuelanas ao mercado de trabalho e o incentivo ao empreendedorismo. Essa ação contará com parcerias com setor privado, para contratação de migrantes, validação de diplomas e serviços e incentivos financeiros. 

“O grande salto no plano para 2021 foi uma melhor integração de necessidades específicas de gênero pelo fato de os e as agentes disporem de mais conhecimento sobre como priorizáar as mulheres”, explica a gerente de projeto da Ação Humanitária da ONU Mulheres, Liliam Litsuko Huzioka. “Ter esses dados de gênero e idade nas diferentes frentes é fundamental para a elaboração e a implementação de ações que correspondam melhor às demandas de migrantes que têm se deslocado pela América Latina, e da parte significativa que chega ao Brasil. Com ações direcionadas, com a incorporação da perspectiva de gênero, os impactos que conseguiremos alcançar serão mais inclusivos, em especial entre migrantes mulheres, meninas e LGBTQI+”, completa. 

Demanda no Brasil Venezuelanas e venezuelanos vivendo no Brasil somavam mais de 260 mil pessoas, em agosto de 2020. De acordo com os dados divulgados no Plano de Resposta a Refugiados e Migrantes 2021 homens e meninos correspondem a 37% e 18%, respectivamente, enquanto mulheres correspondem a 29% e meninas, a 16%. Essa disparidade tem motivos, como maiores dificuldades para mulheres de inserção no mercado do trabalho em comparação aos homens. Segundo relatório da OIM e Operação Acolhida, a taxa de homens que participa do processo de interiorização com emprego garantido em outra cidade é três vezes maior que a de mulheres. Entre as meninas, o risco maior em comparação aos meninos é sofrerem violência e de terem menos acesso a à educação. 

Participação e envolvimento de migrantes –  Promover a proteção, segurança, direitos e dignidade, além de reduzir os riscos e ameaças contra pessoas migrantes venezuelanas, estão entre os objetivos centrais do Plano de Resposta a Refugiados e Migrantes 2021,. Uma das estratégias adotadas nesse sentido tem sido a inclusão, cada vez mais constante, de venezuelanas e venezuelanos no desenho de iniciativas, na implantação das ações e na avaliação dos resultados. O objetivo é que esse envolvimento seja ainda maior em 2021, considerando diversidades de gênero e de idade, e valorizando as experiências e as barreiras superadas diariamente por migrantes mulheres, meninas, homens, meninos, idosos, LBGTQI+ e pessoas com deficiência. 

Esse movimento de envolvimento, assim como o de recortes por gênero e idade, iniciaram no RMRP anterior, desenvolvido para 2020. Para o desenho do plano, todas as organizações envolvidas na resposta à emergência a partir da Plataforma de Coordenação de Resposta a Migrantes e Refugiados da Venezuela (R4V) foram questionadas sobre a relevância e a intenção de envolver pessoas migrantes e refugiadas em diferentes fases de suas ações, inclusive com recorte de gênero e de idade. Dessas, 84% afirmaram que tinham como objetivo final de suas ações a redução da desigualdade de gênero e 11% que teriam ações direcionadas para este objetivo em 2020. A consulta foi feita novamente para o RMRP 2021, com aumento nos dois quesitos – 86% indicaram ter a igualdade de gênero como objetivo final e 14% indicaram ter ações planejadas para este fim em 2021. 

As organizações foram questionadas, ainda, sobre a participação da população migrante e refugiada em diferentes fases das ações de resposta à emergência. Para 2021, 23% das organizações afirmaram que envolveriam em todos os aspectos do gerenciamento da resposta, 59% envolveriam no desenho, 68% na entrega da assistência, 27% na revisão e 68% no gerenciamento de ações envolvendo as necessidades apontadas pela população migrante e refugiada. 

“Também vemos um aumento significativo da percepção sobre a importância do recorte de gênero e de idade para as ações realizadas na resposta à crise migratória venezuelana. Enquanto no RMRP 2020 apenas 37% das organizações afirmaram que fariam recorde de gênero e de idade em suas ações, para o RMRP 2021, temos a manifestação de 68% das organizações que considerarão idade e gênero nas atividades que serão planejadas e executadas”, explica Huzioka. “Isso foi feito a partir de todo o esforço que os atores tiveram em 2020 de construir ambientes e ferramentas de escuta, de realização de atividades que empoderassem essas mulheres, de diferentes idades, para que realmente fizessem parte das ações de resposta à emergência. O resultado que temos, desde então, é o planejamento de ações mais efetivas, que melhor correspondem à realidade local e específica de cada grupo”, completa. 

Ações prioritárias – A gerente da ONU Mulheres também conta que a entidade tem trabalhado intensamente, a partir do programa ‘Liderança, empoderamento, acesso e proteção para mulheres migrantes, solicitantes de refúgio e refugiadas no Brasil’, para promover a autonomia econômica de venezuelanas. Percebemos, em muitos casos, que as mulheres que vêm para o Brasil acabam sendo exploradas, recorrendo a trabalhos degradantes e, em casos mais extremos, as meninas acabam vítimas de trabalho infantil e as mulheres, de exploração sexual. Com a promoção de empregos formais e de capacitações e incentivos ao empreendedorismo, percebemos o empoderamento econômico dessas mulheres e a promoção de uma melhor qualidade de vida não apenas a elas, mas às suas famílias e às comunidades onde estão inseridas”, explica.

Outra necessidade apontada por migrantes e refugiadas venezuelanas no Brasil diz respeito à proteção contra a violação de direitos, em especial contra a violência. Pesquisa realizada por UNFPA, ACNUR e União Europeia em 2020 com 530 mulheres em Boa Vista e Pacaraima mostra que apenas 10,8% das mulheres que sofrem violência baseada em gênero reportam o incidente à polícia – e, destas, apenas 6% recebem algum tipo de apoio ou proteção. Ao mesmo tempo, 20,7% relatam terem sofrido violência sexual ao menos uma vez durante a vida, embora a incidência seja considerada muito mais alta, devido à falta de notificação. 

Com a pandemia, os números da violência contra mulheres se agravaram no estado. Apenas no primeiro semestre de 2020, segundo o Fórum Brasileiro de Segurança Pública, os casos de violência doméstica com lesão corporal contra mulheres aumentaram 32% em Roraima em comparação com o mesmo período do ano anterior. Para os parceiros do RMRP, essa situação exige uma resposta em 2021 que priorize o aumento do acesso a serviços especializados e da capacitação de atores que atendem diretamente essas sobreviventes. Com este objetivo, as ações prioritárias de resposta no Brasil incluem desde capacitações com militares, parceiros e agentes humanitários até projetos para melhorar as oportunidades de inserção de mulheres que vivem em abrigos e ocupações espontâneas.